O humanismo na era da tecnologia – Boletim nº 153 – maio 2017

Não é novidade que vivemos uma época tecnológica. Se isto, por um lado, traz progresso, conforto, bem-estar, por outro nos joga na platitude do comodismo. A sociedade tornou-se utilitária e imediatista – tudo tem que dar resultado agora. E somos jogados numa voragem de consumo, cujo fruto mais visível é o vazio, a existência sem sentido. Perdemos o traço que nos tornou racionais, ou seja, deixamos de ser o home-faber- o homem que faz. Por isto, é urgente uma reação de nossa parte: recuperar o fazer.

Nós que chegamos à terceira idade, com filhos criados, deveres profissionais cumpridos, atingimos o paraíso da aposentadoria, época excelente para o fazer. Fazer o quê? Em especial, cuidar de nossa mente. No exercício contínuo do trabalho, talvez tenhamos ficado um tanto embrutecidos, cegos para a grandeza da vida.

É hora de reverter o jogo. Mais do que nunca, agora somos donos de nós mesmos e do tempo e merecemos nos tratar bem. De que forma? Ouvindo boa música (erudita, jazz, MPB), assistindo a grandes filmes, contemplando as pinturas que os grandes mestres nos legaram e, em especial, lendo as obras-primas da humanidade.

Está comprovado que a leitura rejuvenesce o cérebro. Com a leitura, ativamos nossas sinapses e tal fato remoça a mente. Não basta ler revistas, jornais, obras técnicas. É necessário mergulhar na literatura. Por quê? A literatura explica o inexplicável, a literatura organiza o caos do mundo, este mesmo mundo que é um grande teatro. Os escritores de ponta nos mostram os bastidores destas cenas, aprofundam nossa compreensão de nós mesmos e do outro. Com um bom livro, desenvolvemos a inteligência, a sensibilidade, a intuição, grandes armas para uma vida longa, produtiva, recheada de criatividade.

A arte, em geral, e a literatura, em particular, duplicam nossa capacidade de viver de modo digno. As obras de imensa qualidade são poderosas mediadoras entre diferentes culturas, função primordial hoje em dia, quando tabus e preconceitos infelicitam tantas pessoas, são causa de tanta estupides que estamos cansados de ver.

Na época de ouro de nossa vida, precisamos nos reservar o direito ao silêncio e, no silêncio, dedicar algumas horas à leitura longa, quando entramos nos livros e lhe damos significados, completamos as lacunas deixadas de propósito pelo escritor.

Ler é afiar a mente, recuperar o domínio da língua, manter a saúde de um cérebro em atividade. Ler humaniza o homem e recria a utopia porque, sem esta, nos tornamos manada conduzida pela publicidade, pelas telinhas onipresentes e nem temos ferramentas para distinguir o joio do trigo na atuante internet e nos atirar num redemoinho em que já não pensamos mais.

Neste contexto, é de fundamental importância que a educação emocional seja parte integrante do amadurecimento da pessoa. Igualmente importante a educação para a saúde, o conhecimento do corpo e da mente.

Saber é saber-se limitado, mas também saber que tais limites são elásticos e podemos alcançar muito, desde que a educação seja permanente como projeto de vida e não apenas alguns anos dedicados à busca de um diploma.

Arthur Pereira Oliveira Filho, educador e conferencista e Paulo Venturelli, professor e escritor.

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