O OUTONO DA VIDA– Boletim nº 172
Fragmentos do poema Desejo, de Vitor Hugo:
“Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais.
E que sendo maduro,
Não insista em rejuvenescer.
E que sendo velho
Não se dedique ao desespero,
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor.
E é preciso deixar que eles escorram por entre nós”.
É preciso um pouco de arte na velhice. Uma arte que consiga filtrar aquilo que é piedade, daquilo que é respeito; que consiga separar a tolerância, daquilo que é amor verdadeiro. Os velhos não querem apenas tolerância, nem piedade. Precisam, sim, de respeito, dignidade e inclusão, como qualquer outra pessoa, em qualquer idade. Tolerância é uma palavra pobre, em todos os sentidos. Ninguém quer ser apenas tolerado; as pessoas querem ser amadas e respeitadas.
Prestemos atenção para o óbvio da existência. Aliás, é necessário que o óbvio seja repetido muitas vezes, para não cair no esquecimento. Eis o óbvio: todos os seres vivos, naturalmente, nascem, crescem, reproduzem, envelhecem, adoecem e morrem. Isso é o óbvio, o evidente, a lógica da natureza. Daí decorre que a penúltima companheira que teremos nesta existência chama-se velhice, que nos abandonará para a última companheira, a morte. É o que se deseja a todos: morrer na velhice. Ninguém quer morrer na juventude, o que seria trágico. É no outono que se envelhece e no inverno que se morre. Precisamos seguir o ritmo da natureza com seus encantos e desencantos e como diz Vitor Hugo, “deixar que as estações da vida escorram por entre nós”. O outono não é a pior das estações, nem a melhor. O outono simplesmente é. Simone de Beauvoir (Esposa de Sartre) afirma que “viver é envelhecer. Somente isso”.
O filósofo romano Cícero (Marco Tulio Cícero – 106 a 43 a. C) em um ensaio filosófico sobre a velhice, já dizia em seu tempo, que a velhice não nos afasta da vida ativa. A grande contribuição dos idosos não é mais a atividade física, mas a sabedoria que é o azeite de toda a atividade física. Cícero disse também que “somente os imbecis não querem envelhecer”.
Infelizmente, a velhice no mundo ocidental é um problema que não está resolvido ainda. A velhice denuncia o fracasso da dessa civilização, pois a sociedade capitalista tende a valorizar somente quem produz e quem consome. O foco do capitalismo é a primavera, daí que os ambientes, as cidades, o contexto vital são desenhados tendo em vista os que estão produzindo e consumindo, isto é, para a juventude. Os idosos já produziram e já consumiram o bastante, logo, infelizmente, o melhor que o capitalismo tem a fazer é livrar-se deles, posto que os velhos precisam de cuidados que custam caro. Precisam de aposentadorias, de cadeiras de rodas, de bengalas e muletas, de rampas para ter acesso aos ambientes diversos. Velhos precisam de remédios, de tratamento dentário, de dietas diferenciadas e tudo sem poder devolver nada por isso. É porque já pagaram antes, na primavera, na juventude.
Quanta ilusão e falsidade que ainda existe nas políticas sociais para idosos. A começar pelas pronúncias “politicamente corretas” que nos ensinam, como: a “melhor idade”, “a terceira idade” os “anciãos”, os que “são jovens há mais tempo”. É o mito da “eterna juventude” que enriquece academias e empresas que produzem e comercializam cosméticos e produtos para “rejuvenescer”. Essas mentiras mereceriam tratamento policial. Elas não combinam em nada com respeito nem com afeto e amor.
Dignidade, respeito, inclusão, amor. Então, “a noite, poderá ser a melhor parte do dia”
Prof. Dr. Mario Antonio Betiato
Teologia PUCPR