É uma arte aceitar as mudanças – Boletim nº30 – Junho 2009

Com certeza, todos nos sentiríamos muito satisfeitos se encontrássemos a tão propalada “fonte da juventude”. Não nos foi dado este privilégio. Enquanto a solução não chega, o tempo vai passando; felizmente, para todos, sem exceção. Damo-nos conta de algumas mudanças, aos poucos ou num de repente na frente de um espelho iluminado.

Mudanças acontecem desde o momento em que nascemos, mas depois de meio século de existência, elas têm outro peso e significado. Estão em jogo variáveis muito fortes e interdependentes neste verdadeiro desafio: a vida, as mudanças e o valor de ambas. Saber o sentido dessas mudanças requer uma espécie de esperança no próprio coração das transições da vida: da juventude à idade adulta, dessa à meia-idade (40 a 60 anos); da meia-idade à velhice (após os 60 anos) e suas variações. Cada período com sua carga de experiência parece nos dizer que é preciso mudar com o coração e como em outras fases da vida, a velhice tem lá os seus encantos. Vamos explorá-los.

Paremos para refletir no sentido das mudanças em nossas vidas. A reflexão sobre a velhice é importante para pessoas de todas as idades, não apenas para idosos. Envelhecer ainda é um mistério na condição humana, porque se a Biologia mostra a degenerescência de todos os seres vivos (aí estão as plantas que não nos deixam mentir); a Psicologia teoriza para explicar o porquê a cada nova fase, terminamos por aceitar a idade; a Medicina avança para garantir a longevidade. Eugene Bianchi, teólogo e professor emérito da Universidade de Emory (Atlanta), diz que os admiráveis desenvolvimentos na medicina, nutrição, moradia, transportes, legislação e outros campos ligados à gerontologia, não foram devidamente acompanhados pela teologia, filosofia e ética a respeito da idade que avança.

Mas, convenhamos, como é difícil envelhecer! Parece-nos que hoje é ainda mais difícil que no tempo de nossas tias e avós. Coitadinhas, pareciam mais velhas aos nossos olhos de crianças e… elas tinham apenas 40 anos. Será que hoje, os nossos filhos, sobrinhos e netos não pensam o mesmo de nós? Se assim for, o problema é deles. Fato é que com o avanço da medicina, da tecnologia reparadora, estudos e recomendações de saúde prolongam a vida de homens e mulheres.

Em 2005, a pesquisa Tábua de Vida do IBGE mostrou que no Brasil a expectativa de vida média subiu para 71,9 anos, quando, em 2003, era de 71,3 anos. Só não subiu mais porque a taxa de mortalidade de homens jovens, devido a violência em nosso país, é muito elevada e desequilibra as estatísticas. Os homens vivem um pouco menos (média é 68,2 anos) que as mulheres, cuja média de vida é de 75,8 anos. Mas, a esperança de vida do brasileiro ao nascer é bem menor que no Japão, em que a taxa é superior a 81 anos. Ainda levaremos quase 40 anos para chegar àquele patamar, segundo projeções do IBGE.

Também, prolongar a vida humana e dar-lhe qualidade não é apenas fazê-lo mediante medicamentos. Há uma composição de esforços de natureza físico-orgânica, que inclui tratamentos de saúde, alimentação, exercícios, mas também entendimento psíquico, mental e espiritual sobre a velhice. Afinal, somos corpo e alma. A qualidade de vida dos idosos depende de importantes questões a serem levadas em conta: os hábitos alimentares, a violência, o valor dado à idade avançada, a queda na taxa de mortalidade infantil, e também a posição que a sociedade reserva aos idosos em sua cultura. Há um sacrifício dos velhos, em várias culturas, mesmo que de forma simbólica, e não exatamente como na lenda de Bali narrada pelo teólogo beneditino alemão Anselm Grün, em “A sublime arte de envelhecer” (Vozes, 2008): a tribo eliminava os idosos e chegou a um ponto em que não sabia sequer construir uma casa, pois o conhecimento se foi com os velhos. Então, um jovem, que havia escondido o seu avô, apresentou-o para ensinar a fazer a base e a disposição das toras para uma construção. Os mais velhos daquela comunidade foram poupados, valorizados e a tradição, preservada.

A relação sociológica-cultural com a velhice na nossa sociedade – ocidental, globalizada, tecnologizada – ocorre hoje num contexto de mercantilismo, onde as relações sociais são altamente mercantilizadas, prevalece o individualismo exacerbado, a hiper-valorização da juventude é um fato, ocorre a valorização do produtivismo e da produtividade, além haver elevada carga financeira e psicológica da sociedade com o segmento da população que envelhece, vive mais e requer cuidados e previdência compensadora depois de uma vida de trabalho. Felizmente, não é apenas a dimensão social do preconceito e da discriminação pela idade que vigora em relação à velhice. Se fizermos um exame da nossa vida, vamos nos sentir privilegiados: dispomos de recursos materiais, de uma família, de nossa independência e autonomia.

É importante que a sociedade dê ao idoso espaço para ele envelhecer bem e dignamente. Envelhecer não é assunto só para os velhos, é assunto de todos. Envelhecermos juntos é uma condição de convívio de crianças, jovens, adultos, idosos. Grün é claro neste sentido: “Se quisermos viver com pessoas idosas e acompanhá-las em seu envelhecimento, temos de entrar em contato antes de tudo com o nosso eu que vai envelhecendo. Não se trata, portanto, de só ser gentil com pessoas idosas. Só podemos ser bons para elas se nos entendermos com o nosso envelhecimento e nos aceitarmos.” (p. 75). Agora, se o nosso envelhecimento vai ser proveitoso depende de nós: treinar o envelhecimento de uma forma saudável, afirma categórico. Mas, de que forma, perguntamos? É isso que Grün persegue em seu livro. Convido-os a ler e discutirmos as condições que o autor nos aponta.

                               Silvia Maria de Araújo                                           

                  Socióloga, Professora Sênior da UFPR

6 Respostas para“É uma arte aceitar as mudanças – Boletim nº30 – Junho 2009”

  1. Teste

  2. Silma Maria Ribeiro Silva diz:

    Não sei se envelhecer é uma arte, mas sei que este assunto é difícil. Só quem passa pela experiência de envelhecer é que sabe exatamente o que significa. E como todos, se Deus quiser, é claro, iremos passar por isto, o que temos que fazer? Ler a respeito, seria uma sugestão; visitar asilos, outra sugestão; prestar atenção ao nosso redor e perceber que estamos cheios de idosos nos cercando e aprender a conviver com eles? É certo que, muitas vezes não temos a capacidade de vê-los ou talvez não queremos percebê-los. Então, ignoramos a situação, em um gesto de fulga. É melhor. Sofrer por antecipação não é nada agradável. Mas se tivermos coragem para descobrir, o que não é tão novo assim, e percebermos que o conhecimento ameniza o sofrimento, iremos compreender mais esta fase da vida, que futuramente passaremos por ela. O texto me fez pensar em algo que tenho dificuldade, envelhecer. A verdade é que temos que, cada vez mais, “encarar” a velhice como algo normal, como a juventude. Tarefa difícil, mas é de todos!
    Lerei o livro indicado. Obrigada pela “dica”.
    um forte abraço

  3. Aceitar as mudanças, uma arte. Sempre fui conservador, muito pouco aventureiro, não pacato, mas cumpridor de regras, normas. Hoje, percebo que estou mais aberto às mudanças em todos os sentidos. O convívio com casais em Encontros diversos e com a juventude em Encontro de Jovens “Segue-me” da Igreja Católica e com 4 filhos entre 26 e 23 anos, e suas amizades, faz com que participemos dessas mudanças do mundo moderno encarando o passar do tempo “a velhice” de uma forma mais saudável e mais aberta às mudanças, inclusive à do nosso interior e físico.

  4. Envelhecer não é só para os velhos, gostei do que a socióloga Silvia escreveu, esse assunto mexe
    com todos que estão ao nosso redor, é muito importante que seja absorvido por todos da família, ou seja envelhecer juntos.
    Como a gente sempre diz ” é mais fácil você entender o que os mais velhos falam, do que os mais velhos entenderem os mais novos”.

  5. Conheço jovens que se sentem velhos e pessoas na terceira idade que vivem plenamente , que tem uma vida social normal . Velho é quem não vive.

  6. Irani C.O.Correia diz:

    Texto muito profundo e nos faz pensar no envelhecer. Num trecho do texto compara o envelhecimento com as plantas. Existe toda uma fase na vida humana como na natureza e é muito bom observar isso. Acredito que devemos viver o melhor possível em cada uma das fases e aproveitar o que há de melhor em cada etapa, cada experiência! abraços.

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  1. Eva:

    Teste

    --25 de abril de 2013 @ 18:38
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    1. Silma Maria Ribeiro Silva:

      Não sei se envelhecer é uma arte, mas sei que este assunto é difícil. Só quem passa pela experiência de envelhecer é que sabe exatamente o que significa. E como todos, se Deus quiser, é claro, iremos passar por isto, o que temos que fazer? Ler a respeito, seria uma sugestão; visitar asilos, outra sugestão; prestar atenção ao nosso redor e perceber que estamos cheios de idosos nos cercando e aprender a conviver com eles? É certo que, muitas vezes não temos a capacidade de vê-los ou talvez não queremos percebê-los. Então, ignoramos a situação, em um gesto de fulga. É melhor. Sofrer por antecipação não é nada agradável. Mas se tivermos coragem para descobrir, o que não é tão novo assim, e percebermos que o conhecimento ameniza o sofrimento, iremos compreender mais esta fase da vida, que futuramente passaremos por ela. O texto me fez pensar em algo que tenho dificuldade, envelhecer. A verdade é que temos que, cada vez mais, “encarar” a velhice como algo normal, como a juventude. Tarefa difícil, mas é de todos!
      Lerei o livro indicado. Obrigada pela “dica”.
      um forte abraço

      --29 de abril de 2013 @ 14:22
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      1. Márcio Milagre:

        Aceitar as mudanças, uma arte. Sempre fui conservador, muito pouco aventureiro, não pacato, mas cumpridor de regras, normas. Hoje, percebo que estou mais aberto às mudanças em todos os sentidos. O convívio com casais em Encontros diversos e com a juventude em Encontro de Jovens “Segue-me” da Igreja Católica e com 4 filhos entre 26 e 23 anos, e suas amizades, faz com que participemos dessas mudanças do mundo moderno encarando o passar do tempo “a velhice” de uma forma mais saudável e mais aberta às mudanças, inclusive à do nosso interior e físico.

        --31 de julho de 2013 @ 23:43
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        1. Lucia:

          Envelhecer não é só para os velhos, gostei do que a socióloga Silvia escreveu, esse assunto mexe
          com todos que estão ao nosso redor, é muito importante que seja absorvido por todos da família, ou seja envelhecer juntos.
          Como a gente sempre diz ” é mais fácil você entender o que os mais velhos falam, do que os mais velhos entenderem os mais novos”.

          --17 de novembro de 2013 @ 2:00
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          1. gilceia:

            Conheço jovens que se sentem velhos e pessoas na terceira idade que vivem plenamente , que tem uma vida social normal . Velho é quem não vive.

            --29 de novembro de 2013 @ 17:32
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            1. Irani C.O.Correia:

              Texto muito profundo e nos faz pensar no envelhecer. Num trecho do texto compara o envelhecimento com as plantas. Existe toda uma fase na vida humana como na natureza e é muito bom observar isso. Acredito que devemos viver o melhor possível em cada uma das fases e aproveitar o que há de melhor em cada etapa, cada experiência! abraços.

              --12 de dezembro de 2013 @ 18:34

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