Existe vida depois da carreira profissional – Boletim nº60 – 15 maio 2011
Minha geração experimentou um pujante ambiente de mudanças globais. O avanço tecnológico, as comunicações, a industrialização, o aumento da mobilidade socioeconômica, a produtividade crescente, a sustentabilidade, maior justiça social, a inovação e regimes representativos cada vez mais democráticos e transparentes. Durante esse espaço de tempo presenciou guerras, atos terroristas, a conquista espacial, o entendimento melhorado dos fatos históricos, a popularização das artes e filosofia e crescente nível de acesso educacional. E, pagando também cada vez mais impostos para manter a burocracia de Estado e recebendo cada vez menos proporcionalmente à riqueza da Nação.
O entendimento desta evolução passa por aspectos marcantes na retrospectiva de minha vida.
Minha tia-avó, no bojo de sua sabedoria, dizia que uma pessoa passa por diferentes fases na vida adulta: busca por mudanças, sucesso profissional e manutenção das conquistas alcançadas.
No colegial, meu professor de português dissertava sobre valores, ética e moral. Dizia-nos que os valores constituíam nossa proteção interior contra as mazelas da vida. A ética e a moral modelavam nosso julgamento pela sociedade. Julgamento este que nem sempre poderia ser justo. Concluía que errar era humano, que uma boa formação de estrutura de valores não era um seguro contra o erro, mas uma ferramenta de resgate para com as armadilhas da vida.
Por fim, aprendi que a única coisa permanente e constante na vida é a mudança, a qual na maioria das vezes nos causa perplexidade, ansiedade e insegurança. Somos na verdade “engolidos” por este redemoinho complexo durante a nossa existência.
Ao passar dos anos, a minha reflexão sobre esses fatos e ensinamentos de vida vivida formou meu ativo de sabedoria. Reconheci minhas limitações, falhas, defeitos e sobretudo as boas coisas que consegui fazer. Os erros e as falhas debitados na conta do aprendizado da vida. As limitações para os objetivos não atingidos, os acertos no cumprimento dos deveres para com a sociedade.
Mas afinal o que tem isto a ver com a fase pós-carreira profissional?
Lembranças do meu “calvário” no período de migração de vida profissional ativa e interessante para o “limbo” da vida de aposentado. Os remorsos por falhas e erros sobrepondo os acertos conquistados, espírito de autocrítica prevalecente, preocupação com a saúde, horizontes mais estreitos, maior fragilidade financeira.
Assim, a análise dos acontecimentos de minha existência veio à tona, ponderações de minha tia-avó estruturaram minha forma de refletir sobre os ciclos de minha vida, observações de meu professor permitiram-me avaliar a estrutura de valores que me foi legada e suas interfaces no meu cotidiano de vida.
A engrenagem das mudanças agora mais rápidas e finitas em um mundo cada vez mais complexo.
Em suma, a clara mensagem de que somos protagonistas transitórios em um universo efervescente em transformações.
Todavia, temos a necessidade de regressar à planície de nossa essência vital. Inconscientemente, sinais diversos fizeram-me sentir que agora respiro ares mais puros que outrora, que a família é a minha fortaleza e que um renovado espírito de observação valoriza as boas coisas da vida que não notara ou observara anteriormente.
E, em resumo, o que aprendi com este penoso processo foi a importância de encontrar um caminho alternativo, ou ainda, a necessidade de elaborar um projeto de vida para esta nova fase. Nem por isso deixando de registrar as boas lembranças da vida ativa e deliberadamente abstraindo a saudades dos tempos idos.
Minha percepção tornou-se aguçada para com as restrições impostas nesta etapa de vida, levando-me a considerar que a deterioração física vivida tem de ser sobrepujada pela riqueza de espírito, na qual se encontra a verdadeira felicidade. Difícil, porém, não impossível. Este entendimento, por vezes, é intransponível para muitas pessoas.
Assim reuni um acervo de tendências que no âmago busca por um novo projeto de vida material e espiritual. Requer muito tirocínio e vontade porque impõe regras, disciplina e conhecimento de novas teorias. Traduz na verdade um conjunto de esforços a serem despendidos de forma mais inteligente.
Transitar por novas esferas da sociedade, conhecer novas pessoas, buscar eficiência produtiva de acordo com as limitações existentes, aumentar o conhecimento, despender maior tempo para com a família e ser mais ativo socialmente.
As palavras-chaves compõem um vasto elenco de ações apropriadas a cada pessoa, respeitando seu perfil cultural, social e profissional, mas que fundamentalmente busquem maior solidariedade, qualidade de vida, novos desafios, disciplina, paciência e capacidade de observação mais apurada, e sobretudo a arte de ser útil.
Este elenco de atitudes traz maior percepção de coisas interessantes nesta nova fase de vida e é em particular mais saudável.
Adhemar Villela Filho
Engenheiro Florestal – UFPR e Ex-executivo florestal