A fase da Águia – Boletim nº 4 – Setembro/2007

Para ilustrar o artigo deste mês, vou narrar a  história das águias, com a intenção de levantar uma questão: a necessidade de renovação a que todos nós vamos ter de nos submeter em determinada fase de nossas vidas, em especial quando a aposentadoria  chegar. A essa etapa eu chamaria de “A fase da águia”.

Segundo os especialistas, as águias são aves que podem chegar a viver em torno de 70 anos ou mais. Mas, para atingir essa idade, quando chegam aos 40 anos, elas se submetem a uma “penosa” fase de renovação. Nessa idade, as águias já se encontram com suas unhas compridas e flexíveis, o que as dificulta agarrar com firmeza suas caças para se alimentar. Seus bicos, então alongados e pontiagudos, estão curvos e frágeis. Já suas pomposas asas, outrora apontando-se contra o peito, ficaram envelhecidas e pesadas demais, em decorrência da grossura e do envelhecimento das penas. Por causa disso, voar se torna um ato difícil e complicado.

Então, elas só têm duas alternativas: morrer…ou enfrentar um dolorido processo de renovação que irá durar 150 dias. É a fase da transição.

Esse processo consiste em voar para o alto de uma montanha e recolher-se em um ninho próximo a um paredão, onde elas não necessitem voar. Após encontrar esse lugar, as águias começam a bater com o bico contra a rocha até conseguir arrancá-lo. Então, esperam   nascer um novo bico, com o qual vão depois arrancar suas unhas.  Quando as novas unhas começam a nascer, elas passam a arrancar as velhas penas. E somente depois de cinco meses elas saem para seu famoso vôo de renovação. E poderão viver, então, por mais  30 anos.

A exemplo das águias, em geral o ser humano chega à idade da pré-aposentadoria sentindo-se cansado, esgotado e no limite de suas forças físicas, mentais e o que é pior: com baixa auto-estima e forte tendência a se acomodar ou a se limitar a uma rotina enfadonha e repetitiva, achando que isso vai compensar os “árduos” anos de trabalho – claro que isso depende da felicidade e satisfação que se teve ao longo desses anos todos.  No começo da merecida e tão esperada aposentadoria, tudo são flores. Depois, porém, os dias começam a ficar mais longos – as noites idem – e daí começa a surgir um sentimento de profundo vazio. Em síntese: uma sensação de inutilidade, com suas conseqüências psicossomátidas, incluindo alteração no humor.

Assim como as águias o homem também tem duas alternativas : aposentar-se do trabalho e  da vida  ou então enfrentar um processo de renovação e transformação, só que nesse caso exterior e interior, já que possuímos a capacidade de pensar.

Precisamos nos conscientizar de que, apesar da aposentadoria, a vida não terminou, sendo necessário adotar uma postura e atitude inovadora, motivante e criativa, de forma a encarar esse período como uma rica e promissora travessia de uma etapa para outra da vida, não como o fim do caminho. Isso porque hoje, com os avanços da medicina, a expectativa de vida aumentou e, com ela, a qualidade também.

Acontece que na maioria das vezes, em virtude de vivermos em uma sociedade altamente competitiva e consumista, que valoriza o belo e o jovial, é dada extrema importância aos aspectos estéticos, relegando-se a um segundo plano o lado interior de cada ser, com o conhecimento e experiência acumulados, sem falar na validade dos conselhos que podem nortear a vida dos mais novos.

Nesses tempos modernos, as mulheres e, agora, significativa parcela dos homens passaram a dispor de avançadas técnicas médicas e cosméticas de “rejuvenescimento” facial e corporal – o que implica dizer mudanças apenas na “casca”, não necessariamente na cabeça, isto é: nos hábitos de vida e na maneira de pensar e agir. Isso só pode ser alcançado a partir de um determinado esforço de autoconhecimento e entrega espiritual. 

Mas, convenhamos: de nada adianta essa nova “roupagem” se o essencial continuar inalterado: a mente. E é justamente quando se aproxima a hora da aposentadoria que nos damos conta da importância de se promover também mudanças na maneira de enxergar a vida, preparando-nos para essa nova etapa que está batendo às portas dos nossos corações e almas. Então vem o desespero, que acaba virando pânico descontrolado às vias de se tornar uma doença crônica . 

Apesar de às vezes penoso, já que consiste na revisão de antigos conceitos, valores, hábitos, crenças e atitudes, tal processo de transição da vida do trabalho para a condição de aposentado (ou desaposenado) se tornará menos estressante se fortemente baseado no tripé: vontade de mudar + criatividade + ação. 

Você deve estar se perguntando: mas como isso é possível depois de tantos anos vivendo e agindo como trabalhador, seja braçal ou burocrático?

Esse procedimento é simples e necessita apenas de algum treinamento mental e muita persistência, aliados à paciência e à sabedoria. Experimente, por exemplo, trocar palavras e frases como “trabalho” por “cooperação e convivência”, na família e na comunidade. Substitua os termos “funcionário ou subordinado” por “amigo”. Troque o consagrado “OK” por um espontâneo e “sempre bem-vindo “obrigado”. Enfim, troque o “ter” pelo “ser”, o “material” pelo “espiritual”, entre outras mudanças de hábitos.

Também experimente substituir a busca incessante do desenvolvimento de competências e habilidades técnicas – embora esse item não deixe de ser necessário – pela prática da capacidade de relacionamento interpessoal. 

Dentro desse processo de transformação pessoal, objetivando sua saúde física e mental nessa fase de transição do mundo corporativo para um universo mais individualizado, personalizado e empreendedor, julgo relevante você também se questionar a respeito dos seus novos desafios pessoais, despertando para o prazer  de fazer o que gosta, com o orgulho e satisfação de autodefinir-se como um “desaposentado, sim senhor!”, ou “Graças a Deus!”

Viver como desaposentado é ocupar-se com algo que lhe dê prazer, em atividades remuneradas ou não, sentindo-se útil e necessário à sociedade.

Portanto, siga o exemplo das águias e renove-se para novos e altos vôos, lembrando que os humanos possuem uma vantagem adicional e única em relação às águias e outros animais na face da terra: a inteligência. Isso faz toda a diferença.

 Que Deus o (a) proteja junto com seus familiares.

 Um fraternal abraço e até o próximo artigo,

Armelino Girardi

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